O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) foi um dos organizadores do Seminário Nacional de Reforma Urbana – O povo, sua casa, sua cidade: 60 anos de luta por Habitação e Reforma Urbana, que ocorreu nos dias 23 e 24 de outubro de 2023, com programação na sede do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), Universidade de Brasília (UNB) e Câmara dos Deputados, em Brasília. O evento é considerado um marco da luta por cidades mais justas no Brasil ao completar seis décadas. Em 1963, o Seminário de Habitação e Reforma Urbana catalisou o debate sobre temas latentes para as cidades na época. Promovido pelo IAB, o encontro ficou conhecido como Seminário de Quitandinha, em alusão ao hotel que foi palco das discussões na cidade de Petrópolis/RJ.
Na edição de 2023, o seminário buscou atualizar os debates diante do complexo contexto da urbanidade brasileira, da emergência climática e das metas de desenvolvimento da ONU, entre outros desafios contemporâneos. A programação foi dividida em dois momentos distintos. No primeiro dia, três mesas redondas aconteceram no campus da UnB. Os temas foram “60 anos do SNHRU: retrospectiva histórica”, “Terra, teto e trabalho” e “Justiça socioterritorial e ambiental”. No segundo dia, uma Audiência Pública na Câmara dos Deputados procurou envolver o poder legislativo em propostas efetivas para atender às necessidades urbanas contemporâneas. Antes do Seminário, no dia 21 de outubro, o Colegiado das Entidades de Arquitetura e Urbanismo (CEAU) realizou uma oficina preparatória para incorporar os profissionais nesta nova etapa histórica da luta pelo direito à cidade no país.
Odilo Almeida, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB)
Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Odilo Almeida, a reforma urbana e a solução do déficit habitacional passam pela superação da divisão da cidade entre cidades dos ricos e cidade dos pobres. Ele desatacou que atualmente, as leis de uso e ocupação do solo estimulam essa segregação. “Ao exigirem recuos de frente, lateral e fundos nos lotes, ao exigirem vagas de garagem no interior dos lotes, ao estabelecerem uma quantidade máxima de habitações por lote, ao estabelecerem uma quantidade máxima de área construída, o resultado, quase sempre é a produção de habitações grandes e caras, fora do alcance da população de baixa renda que é obrigada a procurar moradia menor e mais barata na periferia, distantes dos centros urbanos”, afirmou.
A verticalização das nossas cidades, também foi pauta da fala do presidente do IAB, que acredita que isso se fez de forma excludente, abrigando, em média, 100 a 150 habitantes por quadra (ou hectare), visto que a Organização das Nações Unidas (ONU), recomenda como ocupação ideal 450 habitantes por quadra.
“Em outros modelos de urbanização, muito utilizado em cidades europeias e em algumas cidades brasileiras, sem recuos, ocupando toda a quadra, com prédios de até 6 andares, com os pavimentos térreos ocupados por comércio e serviços e os pavimentos superiores ocupados com habitações, sem exigências de vagas de garagem no interior do lote, é possível acomodar entre 1.400 a 1.600 pessoas numa quadra”, alertou Odilo Almeida. Para ele, esse tipo de urbanização permite a oferta de habitações menores e mais baratas, ao alcance da população de baixa renda. Nesse modelo de urbanismo, as atividades urbanas de morar, trabalhar, circular e recrear ficam mais próximas entre si, diminuindo a dependência de transportes motorizados, diminuindo o tempo perdido com trânsito, tornando a cidade mais funcional, mais econômica, menos agressiva ao meio ambiente e de vida comunitária mais segura e mais agradável.
Maria Elisa Baptista, conselheira do IAB, lembra que nesse amplo coletivo de luta pela reforma Urbana, nós, arquitetas e arquitetos urbanistas, participamos ativamente desde a realização pelo Instituto de Arquitetos do Brasil do I Seminário, o S.HRu, em 1963, que ficou conhecido como o Seminário do Quitandinha, por ter se iniciado em Petrópolis, seguido dos encontros no Rio e em São Paulo. Ela destaca que a proposta da Reforma Urbana foi construída no bojo das reformas de base do governo João Goulart, interrompido pelo golpe militar de 64. “Os diagnósticos e as propostas de 63 continuam, como diz Vera França e Leite, constrangedoramente atuais: apesar da longa luta, da constituição de 88 e das leis aprovadas, a realidade urbana, em suas linhas estruturais, pouco mudou. Avançamos em muitos pontos, mas não conseguimos atingir o ponto central: a posse e o direito de uso da terra. Articular os grandes desafios – saúde, educação, moradia, cultura, meio ambiente – é tarefa de todos nós, pois é no território que todas essas políticas se concretizam. Essa a centralidade inarredável e urgente da Reforma Urbana”, afirma.
Mércia Alves, do SOS CORPO – Instituto Feminista para a Democracia; Fernanda Costa, do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU); Adauto Cardoso, do Observatório das Metrópoles, do e Júlia Franzoni, da Campanha Nacional Despejo Zero – Em Defesa da Vida no Campo e na Cidade
A arquiteta e urbanista Vera França e Leite participou do Seminário de Habitação e Reforma Urbana, promovido em 1963 pelo IPASE e IAB em Quitandinha, no Rio de Janeiro. A arquiteta aponta os desafios do desenvolvimento urbano 60 anos depois, amplificados pela questão climática. “Se em 63 falávamos nas reformas de base, hoje temos que recolocar a questão em termos de desenvolvimento urbano, ordenamento territorial do país e desafios climáticos, criando condições para apontar caminhos para o presente e para o futuro”, afirmou.
No Brasil, mais de 80% da população vive em áreas urbanas enfrentando níveis alarmantes de desigualdade social. De acordo com dados da Fundação João Pinheiro existem quase 25 milhões de moradias inadequadas no país, sendo 60% delas chefiadas por mulheres. São problemas de regularização fundiária e de infraestrutura da construção como falta de banheiro e pisos, tetos e paredes descobertas, sem acesso à água e esgotamento sanitário, sem iluminação natural e circulação de ar que ocasionam insalubridade e colocam em risco diariamente a saúde de seus moradores. Neste contexto, dialogar sobre a importância da justiça socioterritorial e ambiental foi tema da última mesa de debate do Seminário Habitação e Reforma Urbana (SHRU) realizada na tarde desta segunda-feira, dia 23 de outubro, na Universidade de Brasília.
O arquiteto e urbanista Adauto Cardoso, do Observatório das Metrópoles, falou que nesses últimos 60 anos, as desigualdades, as precariedades urbanas e habitacionais permaneceram. “Colocar a cidade na agenda pública tem duas dimensões. Tem uma dimensão na agenda pública nacional e uma outra dimensão que é a local”. Segundo ele, que também é professor, estamos vivendo um momento de passagem de gerações. “É muito bom ver essa juventude chegando com ideias, energia, força e esperança. Eu acho que seria muito importante nessa transição a gente preservar essa sinergia que foi tão importante na reforma urbana e é única no Brasil. Não existe em nenhum lugar do mundo. Unir movimento social e entidades de classe da arquitetura, urbanismo, advogados é só aqui. Cada um tem seus problemas, suas pautas e suas prioridades, mas é importante construir uma unidade. Ela não se constrói sozinha”.
A edição do SNHRU60 foi organizado por mais de vinte organizações da sociedade civil e governamental. São elas o CAU Brasil, BR Cidades, Coalizão Negra por Direitos, Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (FeNEA), Fórum Nacional da Reforma Urbana (FNA), Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores Por Direitos (MTD), Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Observatório das Metrópoles, União Nacional por Moradia Popular, Campanha Despejo Zero, Colegiado de Entidades de Arquitetura e Urbanismo (CEAU), Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), SOS CORPO – Instituto Feminista para a Democracia, Associação Brasileira de Estudos Populacionais, Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional – ANPUR, Centro de Direitos Econômicos e Sociais (CDES), Central de Movimentos Populares, Confederação Nacional das Associações de Moradores, Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (CONDEGE), Federação Nacional Das e Dos Estudantes de Direito (FENED), Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Fórum de Trabalho Social em Habitação de São Paulo, ONG Habitat para Humanidade, Instituto Pólis, Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS), Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte, Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM).
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Veja a íntegra da Mesa de Debate:
FONTE DE INFORMAÇÃO: Assessorias de Comunicação IAB e CAU/BR.